Quem deseja construir um corpo saudável e musculoso já sabe: é necessário consumir proteína para que o tecido muscular consiga se desenvolver. E mesmo com a proteína comum dos alimentos, a suplementação com este macro-nutriente passou a ser comum entre os atletas e praticantes de atividades física. O nutricionista Felipe Donatto, doutor em biologia celular e tecidual pela USP (Universidade de São Paulo), lembra que o consumo de proteínas como suplemento se tornou comum nas últimas décadas graças a algumas descobertas científicas. “A técnica de isolamento das fontes de proteínas ficou mais adequada na década de 2000, e foi quando começou a comercialização da caseína para fins esportivos”, conta. “A maior procura por pessoas fisicamente ativas se dá pela qualidade proteica da caseína e sua praticidade, principalmente”. Do leite de vaca que tomamos todos os dias, 3,5% são proteínas. Do total delas, 80% é caseína e 20% é proteína do soro, mais conhecida como whey.
A diferença entre as duas é que, enquanto o whey é digerido e absorvido rapidamente pelo organismo, a caseína tem uma digestibilidade mais lenta, conforme explica Erick Prado de Oliveira, nutricionista doutorando pela Unesp (Universidade Estadual Paulista). “Após realizar o exercício, o corpo abre uma janela de oportunidades para trabalhar na formação muscular”, explica o nutricionista. “A caseína vai liberando os aminoácidos para a construção dos músculos”, conta. A nutricionista Gabriela Kaiser Fullin Castanho, especialista em fisiologia do exercício pela Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), destaca que a caseína é uma fosfoproteína (pois contém ácido fosfórico) de alto valor biológico. “Ela é fonte de aminoácidos essenciais ao organismo e tem como função a diminuição do catabolismo proteico e da síntese muscular, além de melhorar a imunidade”, ressalta a especialista. O catabolismo proteico é o processo em que o corpo se aproveita da energia dos aminoácidos dos músculos quando não encontra energia suficiente vinda da alimentação. Como a caseína causa uma liberação de aminoácidos gradativa, o corpo sente menos necessidade de conseguir energia por meio deste processo. Já a imunidade é melhorada pelo consumo da caseína porque qualquer fonte de aminoácidos essenciais ajuda neste quesito.
Devagar e sempre...
Sabe aquela história da lebre que apostou corrida com a tartaruga? É como se a caseína fosse a tartaruga: não é tão rápida quanto o whey, que é a lebre, mas segue uma constância que alimenta os músculos com aquilo que eles realmente precisam para crescer. Conforme explica Gabriela, a absorção da caseína pelo corpo ocorre de maneira bastante lenta. “Sua digestão dura de cinco a sete horas, podendo prolongar sua ação no organismo”, especifica. Erick conta que a quebra da caseína se dá no intestino delgado. “Enquanto que o whey é absorvido pelo organismo em cerca de 30 minutos, a caseína mantém os aminoácidos elevados por um longo período, já que a liberação não é rápida”, destaca o doutorando. Felipe Donatto explica mais detalhadamente o processo de absorção da proteína. “A caseína, por ser uma proteína globular, demora mais tempo para ser digerida, pois não é facilmente absorvida em ambientes ácidos, formando glóbulos de proteínas no estômago”, informa o especialista. Em um estudo, foi constatado que pessoas que consumiam 40g de caseína à noite, antes de dormir, mantinham um bom nível de aminoácidos no sangue por toda a noite, pois o corpo mantinha a síntese proteica durante as horas de sono. Assim, o consumo dos aminoácidos dos músculos é poupado. “É por isso que a caseína pode ser interessante para consumir também nos intervalos das grandes refeições”, sugere Érick. Não ultrapasse pelo acostamento Encontrada no leite e em todos os seus derivados, a caseína não deve ser consumida como suplemento sem a análise da dieta do indivíduo, conforme alertam os especialistas. “O ideal é suplementar com caseína quando o consumo de proteínas no dia não atingir o recomendado”, explica Gabriela.
“É muito importante realizar uma avaliação da dieta por um profissional, pois geralmente é possível consumir a caseína necessária apenas com alimentos”, lembra Erick. Quanto à necessidade diária de proteínas na dieta de cada um, Felipe lembra que não existe uma tabela ou cálculo específico para isso. “O nutricionista deve calcular as necessidades proteicas e escolher quais fontes de proteínas irão fazer parte do total”. O consumo de caseína não tem grandes efeitos colaterais, mas é necessário estar atento à quantidade de proteína ingerida e às restrições de cada corpo. “Algumas pessoas são intolerantes à lactose e precisam procurar pelo suplemento isolado, ou seja, separado dos outros elementos do leite”, alerta Erick. Gabriela lembra que o excesso de proteína no organismo pode causar alguns males. O excesso de proteína pode comprometer o funcionamento de alguns órgãos ou aumentar parâmetros bioquímicos como a ureia”, previne a nutricionista.
Felipe Donatto resume os problemas que o excesso de caseína pode causar. “Qualquer excesso proteico, independente da fonte, pode sobrecarregar as funções hepáticas e renais”, conclui. Por isso, Erick recorda que é importante ler os rótulos dos suplementos com cautela. “Muitas vezes, os rótulos indicam que se tome mais que o dobro da caseína necessária”, lembra o profissional. “O estímulo acaba sendo o mesmo para os músculos porque o corpo não aproveita toda a proteína, portanto é melhor moderar e evitar o desperdício de suplemento”, orienta. Outro fator que pode comprometer o consumo da caseína é que muitos são alérgicos a proteínas do leite.
“ Quem tem alergia não pode consumir nem o alimento nem a proteína pura”, realça Gabriela. Erick também frisa que de nada adianta consumir a caseína como suplemento se não houver o consumo de carboidrato. “Se houver um estoque baixo de carboidrato no organismo, a quebra da proteína não terá energia para formar os músculos e não será totalmente utilizada”, destaca.
A lebre e a tartaruga de mãos dadas
Não é porque a lebre e a tartaruga apostaram uma corrida que elas devam ser inimigas. Os especialistas não colocam a caseína como superior ou inferior ao whey protein, apenas diferente. “As fontes proteicas podem ser diversas, existe apenas a diferença dos horários para o consumo de cada tipo de proteína”, explica o nutricionista Felipe Donatto. Enquanto que o whey fornece a proteína necessária para o pós-treino, a caseína ajuda o músculo em duas vias: fornecendo aminoácidos para sua constituição e evitando a perda, via catabolismo, daqueles que já constituem o músculo. “A caseína disponibiliza para os músculos os aminoácidos necessários para a síntese proteica que foi estimulada pelo treino e pela suplementação da proteína do soro do leite”, conclui.
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