A proteína isolada do leite, mais conhecida como whey protein, é uma mistura de proteínas isoladas a partir do soro do leite. Ela é composta por várias proteínas: lactoglobulinas, imunoglobulinas, lactoferrina, lactoperoxidase e albumina, sendo rica em aminoácidos essenciais, aminoácidos de cadeia ramificada (BCAAs) e cisteína.
Existem três apresentações da whey protein: a concentrada, que apresenta quantidades variáveis de proteína (até 85%), além de uma quantidade variável de carboidratos e gorduras; a isolada, que tem mais de 90% de proteína, com remoção quase total de carboidratos e gorduras e a hidrolisada, com concentração igual ou superior de proteínas que a isolada, mas com a vantagem das proteínas estarem previamente digeridas e hidrolisadas, sendo estas absorvidas mais rapidamente e oferecendo menor risco de alergia.
O uso da whey protein está associado ao ganho de massa muscular, a diminuição de microlesões e ainda a recuperação muscular pós-treino. Em pessoas idosas, as reduções de massa e força muscular contribuem significativamente para perda no desempenho físico e podem resultar em queda da qualidade de vida e até estilo de vida dependente. Este fenômeno, conhecido como sarcopenia (você pode conhecer mais sobre esse assunto, nessa edição na seção Entenda tudo sobre), pode ter início já a partir dos 40 anos e é responsável por aproximadamente 1,5% dos gastos totais com a saúde nos países ocidentais (Janssen et al., 2004), o que irá aumentar concomitantemente com o número de idosos no futuro, visto que pode se perder 15% de massa muscular a cada 10 anos, se intensificando essa perda ainda mais a partir dos 70 anos (Vitale et al, 2016).
A ingestão proteica é crucial para a manutenção da massa muscular esquelética (Campbell et al., 2008) e para o aumento da taxa de síntese proteica (Biolo et al, 1997).
A whey protein estimula com mais eficácia a síntese proteica se comparada com a caseína (outra proteína extraída do leite, porém com absorção mais lenta), mostrando a importância da digestibilidade e velocidade de absorção com este processo de ganho muscular (Dangin et al, 2001).
Vários estudos demonstram que a combinação de exercícios de resistência e ingestão imediata de proteína estimulam mais o anabolismo do músculo esquelético do que exercícios resistidos sem suplementação proteica ou com suplementação apenas de carboidratos (Esmerck et al., 2001; Andersen et al., 2005 Holm et al., 2006, Hartman et al., 2007). Assim, o aumento da disponibilidade de aminoácidos contidos na whey antes ou após o período exercício de resistência traz benefícios para o crescimento muscular.
Pesquisadores começaram a se concentrar em diferenças relacionadas à idade e na capacidade de aumentar a síntese proteica muscular após estímulos anabólicos. A ingestão de alimentos (especialmente proteínas e aminoácidos) é um forte estímulo anabólico, mas vários estudos mostraram uma resposta menor da síntese proteica muscular na população mais idosa quando comparada a adultos jovens (Katsanos et al, 2005). Consequentemente muitos grupos de pesquisa de perda muscular relacionada à idade estão estudando vários fatores que podem modular o aumento pós-prandial (após a refeição) nas taxas de síntese proteica muscular. O aumento pós-prandial desta taxa em idosos tem mostrado depender tanto da quantidade quanto da composição de aminoácidos da proteína ingerida (Volpi et al., 2003; Rieu et al, 2006).
Além disso, a adição de leucina livre na proteína mostrou aumentar ainda mais as taxas de síntese muscular pós-prandial em homens idosos (WallbBT et al, 2013). A ingestão de outros macronutrientes (carboidratos, gorduras) com proteína pode alterar a digestão proteica e a velocidade de absorção, bem como a resposta endócrina à alimentação, modulando assim o aumento pós-prandial da taxa de síntese de proteínas musculares.
Embora em idosos saudáveis a massa muscular diminua mais lentamente, este processo é acelerado em situações de enfermidade aguda, inflamação sistêmica, internação, repouso no leito ou imobilização (WallBT et al, 2013; Klaude et al, 2012). Em todos estes casos, o suporte nutricional é especificamente requerido para neutralizar a perda de massa muscular, reduzindo assim a prevalência de complicações, visando a qualidade de vida (QV) e melhorando a longevidade, esse suporte é destinado a estimular as taxas de síntese muscular para preservar a massa magra nos idosos, sem a necessidade de ingerir alto conteúdo energético. No entanto, nesses suplementos nutricionais destinados a idosos, o efeito da ingestão simultânea de carboidratos e gorduras com as proteínas e suas proporções e quantidades ideais para evitar perda de massa muscular, continuava a ser elucidado.
Foi então que um artigo publicado no JCEM em 2015 demonstrou que a ingestão de 21g de whey protein, enriquecida com leucina (grupo PRO), um dos aminoácidos de cadeia ramificada, elevou significativamente as taxas de síntese muscular em homens idosos não-sarcopênicos e que a ingestão desta mesma whey juntamente com carboidrato e gordura (grupo PRO-En) não aumentou esta síntese, o que poderia ser esperado pelo aumento de insulina pós-ingestão (presença de carboidratos com a whey), tanto pelo aumento de disponibilidade de aminoácidos fornecidos pela whey, quanto pelo aumento da perfusão muscular e diminuição da degradação proteica pela ação da insulina.
Vale a pena ressaltar que a liberação de insulina do grupo de whey com carboidrato e gordura (PRO-En) foi significativamente mais elevada que a do grupo com apenas whey protein (PRO). Mas, os dois grupos apresentaram síntese proteica superior a do grupo que usou apenas um isocalórico (En) contendo carboidrato e gordura, sem whey protein, o que demonstra o grande benefício da proteína isolada do leite, rica em BCAA no estímulo deste aumento de massa muscular. A presença de insulina é mais permissiva na oferta destes aminoácidos do que seu papel estimulatório desta síntese muscular.
Em outro estudo, também publicado no JCEM em 2015, 208 idosos (mulheres em torno de sessenta anos e homens em torno de setenta anos) foram divididos em dois grupos, sendo que em um deles acrescentando 45g de whey protein isolada na dieta diária e no outro grupo controle, suplemento isocalórico com carboidratos. Vários parâmetros foram acompanhados e avaliados por dezoito meses. A massa magra total (P.011) e a massa magra (P.003) diminuíram significativamente no grupo controle (com carboidratos) a partir da linha de base, enquanto que a massa magra permaneceu inalterada no grupo que ingeriu whey protein. A massa magra total foi maior no grupo de proteínas (P.069) e a massa magra do tronco (toraco-abdominal) foi significativamente maior com suplementação proteica (P.048) após 18 meses. Também na figura 2, vemos na tabela que a gordura corporal total aumentou significativamente ao longo do estudo no grupo de carboidratos (P.018), o que não foi observado no grupo que suplementou com whey protein. Ressaltando que não houve mudança no IMC entre os dois grupos (9 meses: P .624; 18 meses: P .742)
Vários suplementos nutricionais são oferecidos a população idosa em casas de repouso, clínicas, ou até mesmo na própria casa com o intuito de fornecer energia e outros nutrientes (gorduras, proteínas, vitaminas, oligoelementos). No entanto, a suplementação nutricional visando a preservação da massa muscular deve ser utilizada tanto na população idosa geral, como em idosos com risco de perda muscular acelerada por imobilização, doenças ou traumas, fatores de grande influência na mortalidade.
Recentes estudos sugerem que o uso de whey protein pode tanto ajudar a prevenir, quanto servir de suplemento para pacientes diabéticos, tanto praticantes de atividade física quanto sedentários. Um estudo feito no Reino Unido, publicado este ano na Diabetes Times, demonstrou que o uso de 15g de whey protein usado antes das refeições, além de aumentar a saciedade e melhorar a glicemia pós prandial, pode a longo prazo apresentar benefícios cardiovasculares, como melhor controle da pressão arterial, do colesterol e do peso. Estudos anteriores mostraram que a whey protein aumenta a captação de glicose pelas células, fato explicado pela translocação do receptor GLUT-4; ainda em outros estudos clínicos, o uso de whey retardou o esvaziamento gástrico por aumentar a secreção de peptídeo similar ao glucagon tipo 1 (GLP-1) e ainda diminuiu a glicemia pós prandial em pacientes diabéticos (Pal et al, 2010; Graf et al, 2011).
Mais estudos tanto em idosos quanto em diabéticos estão em andamento e ainda são necessários para elucidarmos, por exemplo, a influência da whey protein na síntese muscular em indivíduos diabéticos treinados e praticantes de atividade física. Com o aumento progressivo da população de idosos e infelizmente com a incidência e prevalência de diabetes tanto em nosso país quanto no mundo, especial atenção na prevenção e melhora da qualidade de vida e da longevidade, abrindo espaço para o responsável e seguro uso de suplementos nutricionais como a whey protein e da creatina, já discutida nas colunas das edições anteriores.
Tatiana Camargo Pereira Abrão
CRM 95.121-SP
Médica Endocrinologista e Nutróloga. Especialista em Endocrinologia e Metabologia, PUC/SP/2003. Pós-graduada em Nutrologia, USP/Ribeirão Preto/2004. Especialista em Nutrologia – AMB/CFM. Pós-graduada em Medicina do Esporte/2013 e Nutrologia Esportiva/2015
Paulo Cavalcante Muzy
CRM 115-573-SP
Médico pela Escola Paulista de Medicina – Unifesp/2004. Especialista em Ortopedia e Traumatologia Unifesp/2009. Diretor Médico IFBB Brasil, desde 2011, docente dos Cursos de Medicina Esportiva e Nutrologia Esportiva da Fisicursos/HZM, desde 2012 e docente dos cursos de Medicina Esportiva BWS, desde 2016
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