Os aminoácidos de cadeia ramificada (BCAAs), leucina, isoleucina e valina, estão entre os nove aminoácidos essenciais para nós seres humanos e representam 35% dos aminoácidos essenciais nas proteínas musculares. Os aminoácidos essenciais fazem parte do grupo de suplementos que pode ser eficaz na melhora do desempenho e no ganho de massa magra, ou ao menos para evitar o catabolismo muscular.
Muitos atletas e fisiculturistas usam suplementos de BCAA como recurso ergogênico, melhorando a saúde física, o desempenho e o aumento do músculo esquelético (Cromiak, 2002). Além disso, os aminoácidos, em particular os BCAAs, são utilizados clinicamente para atenuar a atrofia muscular induzida pela dieta (Layman,2003), para facilitar a cicatrização de feridas (Collins et al,2005) e para evitar a sarcopenia, que é a perda muscular devido à idade (Volpi et AL, 2003). Ainda sobre a sarcopenia, em alguns estudos, notou-se que o uso de leucina melhorou tanto a síntese proteica, quanto aumentou a massa magra de idosos diabéticos e sarcopênicos (Leenders;Loon, 2011). Outro estudo relatou que três meses de suplementação de aminoácidos essenciais (15 g/d) aumentou a massa magra corpórea, a síntese proteica muscular basal e a expressão de IGF-I em mulheres idosas (Dillon e cols, 2009). Existem evidências de que a suplementação com BCAA, em combinação com o carboidrato, estimula agudamente a síntese proteica e a recuperação dos estoques de glicogênio, promovendo um aumento do limiar de fadiga durante os exercícios aeróbicos intensos (Campbell et al, 2007).
Quanto a fadiga central, a explicação se baseia no fato de que em exercícios prolongados ocorre aumento da produção e da utilização de ácidos graxos, como fonte de energia pela depleção do glicogênio muscular e hepático. Estes ácidos graxos ligam-se à albumina e acabam aumentando a disponibilidade de triptofano circulante, que é precursor de serotonina, e, ao atravessar a barreira hemato-encefálica, leva ao aumento da produção de serotonina, consequentemente à sensação de fadiga. Sendo assim, os BCAAs agiriam na diminuição da fadiga atuando no bloqueio do transporte do triptofano através da barreira hemato-encefálica.
Os BCAAs exercem efeitos endócrinos. Existe uma relação entre a ingestão de BCAAs e a resistência insulínica, ainda não bem esclarecida, baseada em estudos que sugerem que sua ingestão seria um fator de proteção contra o sobrepeso, a obesidade (qin LQ et al, 2011) e a diabetes mellitus tipo 2, principalmente em mulheres (Nagata et al, 2013). Os aminoácidos essenciais, incluindo os BCAAs, são bem conhecidos por ter efeitos pluripotentes sobre o pâncreas, incluindo a promoção de insulina e a secreção de glucagon em seres humanos e animais (Tabaru et al, 1998).
Dos BCAAs a leucina tem sido relatada como o estimulador mais potente de insulina secreção, em animais (Kuhara et al, 1991). Sabe-se que os BCAAs podem ser oxidados no músculo esquelético, enquanto outros aminoácidos essenciais são catabolizados principalmente no fígado (Rennie, 1996). O exercício físico aumenta muito o gasto de energia e promove a oxidação de BCAAs, acredita-se que eles contribuam para o metabolismo energético durante o exercício como fonte de energia e substratos para expandir o pool de intermediários do ciclo do ácido cítrico (anaplose) e também para a gliconeogênese. Em contraste, a leucina é especial porque promove a síntese de proteína muscular in vivo quando administrada via oral a animais (Kimball,2002). Como consequência destas descobertas, os BCAAs estão recebendo considerável atenção como suplemento dietético potencialmente útil para indivíduos que gostam de exercício e participam de esportes.
Os BCAAs podem ser oxidados nos músculos esqueléticos e sua oxidação é aumentada pelo exercício. Foi relatado que o exercício de resistência ativa o complexo BCKDH (complexo enzimático que oxida os BCAAs) em músculos esqueléticos humanos e de ratos ??e também em fígado de rato (Kobayashi et al, 1999).
É bem conhecido que a alimentação de uma dieta de baixa ingestão proteica ou sem proteína inativa, o complexo BCKDH, proporciona um mecanismo de conservação de BCAAs para a síntese de proteínas sob condições deficientes em BCAA. Mas, quando os ratos alimentados com a dieta de baixa ingestão proteica executaram exercício físico, os complexos hepáticos BCKDH aumentaram significativamente, sugerindo que o catabolismo do BCAA é promovido pelo exercício, mesmo em ratos que são deficientes em BCAA. O exercício estimula a oxidação tanto do BCAA quanto dos ácidos graxos, considerando a relação entre os dois sistemas metabólicos. A promoção da oxidação de ácidos graxos parece estar associada a maiores taxas de oxidação de BCAA, o que sugere que os ácidos graxos podem ser reguladores da oxidação de BCAA. Ainda que a atividade da oxidação dos BCAAs, ou seja, do complexo BCKDH, que mede a taxa de oxidação do BCAA, é diretamente proporcional à disponibilidade de BCAA e inversamente proporcional à disponibilidade de glicogênio (de carboidrato armazenado nos músculos e fígado), mostrando a importância da suplementação de carboidratos em exercícios mais longos.
Os efeitos da suplementação do BCAA antes e após o exercício sobre o metabolismo da proteína muscular e os danos musculares induzidos pelo exercício foram examinados em seres humanos. Foi relatado que um suplemento oral de BCAAs (77mg/kg de peso corporal) antes do exercício aumentou os níveis intracelulares e arteriais de BCAA durante o exercício e resultou na supressão da quebra proteica, ou seja, da massa muscular e proteica. Também foi relatado que a administração oral de BCAA (12g/d por 2 semanas e 20g adicionais antes e após o teste de exercício) suprimiu o aumento da atividade da creatina quinase (CK) sérica durante vários dias após o exercício (Coombes &McNaughton, 2000). Efeitos similares também foram observados em um estudo que os indivíduos ingeriram uma mistura de aminoácidos (que continha 3,6g de aminoácidos com 37% de BCAAs) antes e após o teste de esforço e 2 doses da mistura de aminoácidos durante 4 dias, após exercício (Nosaka, 2003). O suplemento de aminoácidos também diminuiu a dor muscular que geralmente surge após o exercício (DOMS). Embora o mecanismo responsável pelos efeitos protetores da suplementação de BCAA contra os danos musculares induzidos pelo exercício e a dor não tenham sido esclarecidos, presume-se que a estimulação da síntese de proteínas pela leucina e a supressão da degradação da proteína induzida pelo exercício pelos BCAAs podem estar envolvidos.
O efeito anti-catabólico dos BCAAs foi bem descrito por Howatson e colaboradores, demonstrando redução do dano muscular induzido pelo exercício de força nas doses de 20g (proporção 2:1:1 de leucina, isovalina e valina), administradas tanto pré-exercício como pós-exercícios. Alguns estudos com leucina mostraram que a oxidação dos BCAAs aumentam somente 2 a 3 vezes durante exercícios prolongados, enquanto a oxidação de gorduras e carboidratos aumentam 10 a 20 vezes. Além disso, a síntese de proteína muscular é reforçada após o exercício. Pode-se então concluir que a exigência de BCAA é aumentada pelo exercício.
A suplementação com BCAA antes e depois do exercício tem efeitos benéficos para diminuir os danos musculares induzidos pelo exercício e promover a síntese de proteínas musculares, sugerindo que os BCAAs são úteis em relação ao exercício e esportes. Embora em muitos estudos de exercícios com humanos, uma dose de apenas 0,5 g de BCAA tenha sido utilizada como suplemento, a dose mínima para produzir os efeitos benéficos da suplementação com BCAA ainda não foi certamente estabelecida.
Estudos da toxicidade dos BCAAs usando animais mostraram que esses aminoácidos são bastante seguros quando fornecidos numa proporção semelhante à da proteína animal (por exemplo, uma relação leucina: isoleucina: valina 2:1:1).
Okazaki e cols promoveram dois estudos de toxicidade, sendo um de toxicidade aguda e subaguda, usando camundongos e ratos e o outro de toxicidade crônica usando ratos. A composição de BCAA utilizada nestes estudos foi uma razão de leucina: isoleucina: valina de 2,1: 1: 1,2. Nenhum animal morreu a partir da dose única de 10g de BCAA/kg de peso corporal no estudo de toxicidade aguda. Nenhum efeito tóxico de BCAA foi observado numa dose de 2,5/g/kg durante 3 meses ou 1,25 g/kg/dia durante 1 ano. Não há relatos sobre a toxicidade do BCAA em relação ao exercício e aos esportes. Porém, convém ressaltar que, mesmo a leucina sendo o aminoácido mais potente entre os BCAAs, a sua suplementação sozinha pode causar desequilíbrio através do efeito de ativação do seu cetoácido no complexo BCKDH (de oxidação e degradação do BCAA).
Vários grupos de pesquisa examinaram se a suplementação de BCAA poderia ter efeito benéfico no desempenho dos exercícios de resistência, mas alguns resultados são inconsistentes, e mesmo sendo poucos, alguns resultados não foram conclusivos em estudos envolvendo a suplementação em algumas modalidades de endurance, sendo necessário estudos adicionais para esclarecer a quantidade adequada de suplementação de BCAA para efeitos benéficos e os mecanismos responsáveis nestes benefícios.
Baseado em tudo isso, conclui-se que doses eficazes estão por volta de 3 a 25g diárias, sendo que sua quantidade ideal deve corresponder entre 2,5 a 3% da quota calórica diária (Hohl et al, 2016). Não deve ser esquecido que em suplementos hiperproteicos (whey protein, proteína hidrolisada da carne, albumina, blends proteicos) contém valores significativos de BCAAs e se houver uma dieta rica em proteínas, pode não ser necessário consumo adicional de BCAA, sendo importante a prescrição e orientação do seu médico ou nutricionista.
Tatiana Camargo Pereira Abrão
CRM 95.121-SP
Médica Endocrinologista e Nutróloga. Especialista em Endocrinologia e Metabologia, PUC/SP/2003. Pós-graduada em Nutrologia, USP/Ribeirão Preto/2004. Especialista em Nutrologia – AMB/CFM. Pós-graduada em Medicina do Esporte/2013 e Nutrologia Esportiva/2015
Paulo Cavalcante Muzy
CRM 115-573-SP
Médico pela Escola Paulista de Medicina – Unifesp/2004. Especialista em Ortopedia e Traumatologia Unifesp/2009. Diretor Médico IFBB Brasil, desde 2011, docente dos Cursos de Medicina Esportiva e Nutrologia Esportiva da Fisicursos/HZM, desde 2012 e docente dos cursos de Medicina Esportiva BWS, desde 2016
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