Artigo: Perda de Gordura

Certa vez, perguntaram para o campeão de boxe Muhammad Ali quantos abdominais ele era capaz de fazer. “Quinze ou vinte”, respondeu o lutador, para o espanto de todos. “Só isso?”, alguém indagou, incrédulo. “Eu não conto os abdominais que faço”, Ali replicou, “Eu só começo a contar quando começa a doer, porque estes são os únicos que precisam ser contados. Isso que faz você ser um campeão”. Ali compreendia que, mais importante do que o número de abdominais que era capaz de fazer, era sua capacidade de superar suas próprias limitações. 

As palavras de Ali remontam a duas verdades incontestáveis: a mentalidade de um lutador muito se assemelha à de um bodybuilder e ambos têm muito a aprender um com o outro.

Nos dias de hoje, o MMA tomou a liderança na busca pela atenção do público, entre os esportes de combate e, enquanto alguns enxergam apenas socos e chutes, temos que compreender que muita preparação antecede o momento em que os golpes, finalmente, começam a ser trocados no octógono – em especial a dificultosa jornada para “bater o peso”, um assunto polêmico dentro da própria comunidade da luta. 

É provável que você não esteja pretendendo disputar o cinturão do UFC, mas é seguro dizer que milhares de pessoas se sentem insatisfeitas com o que enxergam no espelho e o conhecimento oculto dessa classe de atletas pode beneficiar – e muito! – quem busca uma vida mais saudável e finalmente fazer as pazes com os ponteiros da balança.

Além do MMA, diversos outros esportes de luta dividem suas pelejas por classe de peso: boxe, muay thai, wrestling, judô, karatê, etc. Um estudo recente publicado no Strenght and Conditioning Journal explorou alguns dos métodos que lutadores empregam para chegar ao peso desejado – um território ainda largamente inexplorado pelos especialistas em condicionamento físico – e alguns fatos se destacaram. Esses são fatos que todo lutador profissional sabe – e nunca te contaram.

Fato 1 – De olhos nos carbos: Se a intenção é diminuir gordura corporal, lutadores evitam consumir carboidratos simples dentro de quatro horas de se exercitar. Isso porque a ação desses alimentos limita a oxidação e utilização lipídica, atenuando a perda de gordura (principalmente quando se trata de alimentos de alto índice glicêmico).

Fato 2 – Intensidade total nem sempre é o melhor caminho: Embora exista evidências que mostram que oxidação de gordura é melhorada em cenários de restrição de carboidratos, é importante notar que essa mesma condição aumenta o potencial de oxidação de aminoácidos – resultando em perda de massa muscular. Tanto para lutadores quanto para bodybuilders, não é interessante trocar gordura por menos força em performance. A técnica utilizada pelos lutadores nesses casos (também muito difundida na comunidade do bodybuilding) consiste em reduzir a intensidade durante treinos com objetivo de queima de gordura, para minimizar a perda simultânea de músculos. 

Fato 3 - Suplemente de forma inteligente: Interessantemente, a duração estendida dos exercícios aeróbios em baixa intensidade promove aumento na taxa de oxidação de ácidos graxos e uma igual diminuição na utilização de carboidratos. A pesquisa publicada no Strenght and Conditioning Journal sugere que a ativação lipídica aumenta durante treinamentos quando não há a utilização de carboidratos de forma tradicional. Mas, como apontamos anteriormente, pode haver quebra proteica nesse cenário. A recomendação é suplementar de acordo com o objetivo em pauta: para prevenir perda de massa magra, lutadores suplementam com BCAA e proteínas de longa absorção durante o treino.

Fato 4 – Dividir é mais: Lutadores costumam treinar em sessões diárias que podem chegar a acontecer em quatro períodos – todas com objetivos e estratégias diferentes, principalmente nos meses que antecedem uma grande luta (período e sistema que chamam de ‘camp’). Isso possibilita que promovam queima de gordura em níveis ainda mais elevados. A reserva de gordura tende a aumentar no decorrer do dia, mas é possível manter a utilização de gordura como fonte de energia ao continuar a se exercitar após intervalos de descanso. Como tempo é um bem precioso e escasso para a maioria de nós, uma boa estratégia (e a mais realista, dentro do alcance das pessoas) é dividir o treino em duas metades, preferencialmente pela manhã e depois à noite.

Fato 5 – Queima gordura quem cedo madruga: A tradição da corrida matinal, em jejum, como feita por Rocky Balboa nas ruas da Filadélfia ou Mike Tyson pelos subúrbios de Nova York, realmente funciona: considerando que, em tal cenário, não há ingestão considerável de carboidratos, a baixa disponibilidade de açúcar no sangue para o treino é mais propensa a otimizar adaptação do músculo esquelético e sensibilidade à insulina, ao mesmo tempo que, como explicado anteriormente, maximiza a oxidação de gordura. Por isso, lutadores costumam fazer treinos mais leves e adaptáveis de manhã e guardam as sessões pesadas de peso e técnicas de combate para mais tarde no dia, quando já estão com o ‘tanque cheio’.

É claro que outras dezenas de técnicas são empregadas por lutadores que querem bater peso a fim de cumprir um contrato milionário com uma liga internacional de lutas. Algumas envolvem diuréticos e diminuição da retenção hídrica a níveis extremos, como já documentado em diversas reportagens televisivas. Assim como um fisiculturista em condição de ‘palco’, o físico que um lutador apresenta na pesagem é essencialmente diferente daquele que ele carrega rumo à jaula no dia seguinte – às vezes com vários quilos de diferença. Podemos concluir, portanto, que tais práticas são a exceção, não a regra, e devem ser consideradas somente por atletas de alto nível e com acompanhamento médico. Já os fatos aqui listados podem ser tomados como referência para o planejamento de qualquer protocolo de queima de gordura. 

Ao empregar as técnicas dos lutadores, enxergará a verdade contida na afirmação do boxeador Ali, que abre este artigo: antes de se tornar um campeão na vida, você terá que se tornar um campeão em sua mente.