Dr. Lucas Caseri Câmara
Médico especialista em Medicina do Exercício e do Esporte, em Medicina Física e Reabilitação (UNIFESP). Doutorando do programa de Saúde Baseada em Evidências da UNIFESP
Atualmente, com o crescimento exponencial da procura por dietas vegetarianas, em geral por desconhecimento, muitos ainda questionam se este tipo de alimentação seria adequado para praticantes de atividade física recreativos ou até mesmo em nível atlético.
Mas, a segurança e a adequabilidade (para diversas fases da vida e atletas) de dietas vegetarianas (incluindo veganas, ou seja, sem alimentos de origem animal) já foi assegurada cerca de 10 anos atrás pela Associação Dietética Americana (American Dietetics Association), através de um posicionamento realizado após revisão sistemática e avaliação crítica da literatura científica.
Em 2016, corroborando o posicionamento anterior, a Academia de Nutrição e Dietética (Academy of Nutrition and Dietetics) também emitiu um posicionamento sobre a adequabilidade de dietas vegetarianas e veganas em diferentes aspectos: tratamento e prevenção de doenças clínicas, em atletas e nas diferentes épocas da vida, incluindo a gestação, infância e adolescência, adultos e idosos.
Assim, especificamente avaliando a adequabilidade em caráter esportivo, Craddock e colaboradores (2016) realizaram uma revisão sistemática da literatura para avaliação comparativa de dietas onívoras e vegetarianas. Foram encontrados sete estudos randomizados e controlados e um estudo transversal, dos quais as conclusões após as análises foram: não há incremento nem prejuízo da performance esportiva e não foram encontradas diferenças significativas em diferentes medidas de desempenho, assim como na força e potência muscular e nas capacidades aeróbias e anaeróbias.
Os pesquisadores Joel Fuhrman e Deana Ferreri, escreveram um interessante artigo de revisão narrativa em 2010, que versa especificamente sobre alimentação vegana para atletas competitivos. Citam que este tipo de dieta é uma opção saudável para atletas e que assim como para outros atletas, onívoros por exemplo, é indicado o consumo frequente e adequado de feijões, folhas verdes, sementes, castanhas, grãos integrais, frutas e legumes, maximizando a performance atlética, melhorando a recuperação e a resistência a doenças.
Eles ressaltam que uma dieta, incluindo atletas, não deve ser balizada apenas pela distribuição dos seus macronutrientes, mas deve ser composta de boa qualidade e quantidade de micronutrientes.
Com relação a ingesta adequada de macronutrientes, outra grande fonte de preocupação dos que não estão habituados com dietas vegetarianas para atletas e em especial com proteínas, o pesquisador David Rogerson recentemente publicou (2017) um artigo de revisão no periódico Journal of the International Society of Sports Nutrition.
Neste, ele destaca que o adequado manejo dos alimentos, preferencialmente sob orientação de um profissional, permite que dietas vegetarianas sejam adequadas na grande parte de todos os macro e micronutrientes. Como recomendações, sugere o consumo de 1,4 a 3,2g/kg/dia de proteínas, 4 a 12g/kg/dia de carboidratos e 0,5 a 1,5g/kg/dia de gorduras (ou 30% do valor calórico total).
As recomendações acima, são bastante parecidas com as que foram feitas pelo American College of Sports Medicine em recente posicionamento (2016). Assim, sugeriram consumos de 1,2 a 2g/kg/dia de proteínas, 3 a 12g/kg/dia de carboidratos e não ter menos de 20% do volume calórico de gorduras (com 10% no máximo de gorduras saturadas). Ainda neste posicionamento, apontou-se que proteínas de fonte vegetal são adequadas para uso como alimentos ou na forma de suplementação.
Neste sentido, é sempre importante lembrar que o corpo precisa quebrar (via digestão) as proteínas, para que estas sejam absorvidas como aminoácidos. Estes últimos, após absorção, vão compor a matéria prima para construção de proteínas musculares (entre muitas outras funções dos aminoácidos). Ou seja, independe a fonte pela qual o organismo obtém os aminoácidos, desde que sejam em qualidade e quantidades adequadas, pois não há proteína exógena que entra no corpo, as proteínas que compõe o nosso organismo são sintetizadas pelo próprio organismo através dos aminoácidos ingeridos via alimentação ou suplementação (endógenas).
E assim, há de se esperar então que não haja diferenças entre proteínas oriundas de fontes vegetais ou animais (alimentos ou suplementos), desde que sejam semelhantes em tipos e quantidades de aminoácidos. Para corroborar este pensamento, pesquisadores americanos da Universidade de Miami apresentaram um resumo de um estudo científico no 14º Congresso da Sociedade Internacional de Nutrição Esportiva, em junho de 2017, em Phoenix AZ (EUA). Douglas Kalman e Alison Escalante avaliaram 11 atletas jovens saudáveis de MMA realizando treinamento intenso (5x/sem. de duas sessões de treino dia + 1x/sem. sabado + 2x/sem musculação), comparando a ingesta de 75g/dia de proteína (Whey Protein VS Proteina Isolada de Arroz).
Foram avaliadas medidas antropométricas, antes e após seis semanas de suplementação via ultrassonografia, com as dietas habituais mantidas constantes. Como resultados não houve diferença estatisticamente significante entre os dois grupos (Whey/Rice) para o peso, massa muscular, % gordura, massa de gordura.
Os autores concluíram que na presente análise, após a adição média de 0,92g/kg de peso corporal de suplemento proteico, não houve diferença da fonte proteica e ambas foram adequadas para manutenção de peso e composição corporal de atletas de MMA durante período de treinamento intenso.
As fontes de proteína vegetal atualmente mais utilizadas como suplemento são as do arroz, da ervilha, hemp protein e da soja, nas suas formas isoladas e concentradas. Quando existe combinação das proteínas, por exemplo arroz e ervilha, a composição do aminograma (qualidade e quantidade) apresenta-se bastante semelhante ao encontrado no whey protein.
As quantidades e qualidades devem ser orientadas sempre por um profissional graduado em nutrição, para garantir que estejam adequadas as características individuais, assim como saúde, gosto e preferência, e demanda energética modalidade específica.
REFERÊNCIAS:
Position of the Academy of Nutrition and Dietetics: Vegetarian Diets. J Acad Nutr Diet. 2016;116:1970-1980.
Position of the American Dietetic Association: Vegetarian Diets. J Am Diet Assoc. 2009;109: 1266-1282.
Craddock JC, et al. Vegetarian and Omnivorous Nutrition— Comparing Physical Performance. IJSNEM Vol. 26, No. 3, 2016
Kalman D, Escalante A. Disponível em: https://link.springer.com/article/10.1186/s12970-017-0188-5 , poster 34
Fuhrman J, Ferreri DM. Fueling the vegetarian (vegan) athlete. Curr Sports Med Rep. 2010 Jul-Aug;9(4):233-41.
Rogerson D. Vegan diets: practical advice for athletes and exercisers . Journal of the International Society of Sports Nutrition (2017) 14:36
Thomas DT, Erdman KA, Burke LM. American College of Sports Medicine Joint Position Statement. Nutrition and Athletic Performance. Med Sci Sports Exerc. 2016 Mar;48(3):543-68.
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