- Tatiana Camargo Pereira Abrão - Médica Endocrinologista e Nutróloga Especialista em Endocrinologia e Metabologia
- Paulo Cavalcante Muzy - Médico especialista em Ortopedia e Traumatologia
O iodo é um oligoelemento essencial, necessário para o desenvolvimento e o crescimento e tem papel importante na função e metabolismo da tireoide. Tanto a ingestão excessiva do iodo, quanto a sua falta, podem levar à disfunção tireoidiana e os vegetarianos têm demonstrado consumir ambas as entradas excessivamente altas e baixas, dependendo de suas escolhas alimentares.
Um estudo publicado por Krajcovicova - Kudlackova e cols. em 2003, constatou que 80% dos veganos eslovacos eram deficientes em iodo, enquanto Lightowler e Davies, em 2009, publicaram um estudo constatando excesso no consumo de iodo pela alta ingesta de algas marinhas.
As fontes mais comuns de iodo incluem peixes e frutos do mar, produtos lácteos, ovos e sal iodado e a sua necessidade diária (IDR) para adultos é em torno de 150μg/dia. O teor de iodo nos alimentos varia de acordo com o teor de iodo do solo onde o alimento é cultivado, além dos métodos de produção utilizados e a estação em que são cultivados, variando também das espécies de peixes.
Goitrogens são substâncias encontradas em vegetais crucíferos como repolho, couve-flor, nabo, brócolis, rúcula, agrião, couve e couve de Bruxelas e estas substâncias (isotiocianatos) podem interferir na absorção do iodo e na síntese hormonal tiroidiana, impedindo que a glândula tenha captação e utilização do iodo e, assim, alterando sua função se consumidos em quantidades maiores. Porém, estudos demonstram que cozinhar esses alimentos acarretará na destruição de muitos destes compostos ‘goitrogênicos’, tornando este efeito improvável. A fermentação também é um processo indicado e que consegue diminuir estes compostos. Por esta razão, veganos devem limitar o consumo destes alimentos crus, sempre que possível.
Algas e algas marinhas são boas fontes de iodo vegan-friendly. Rauma Al. e col relataram casos de veganos que ingeriram iodo em excesso pelo consumo de algas (Rauma al et al, 1994) e essa ingesta excessiva ocasionou alteração da função tiroidiana, sendo descritos casos de elevação do hormônio estimulante da tireoide (TSH), hipotireoidismo (Key TJA e cols, 1992) e hipertireoidismo induzido pelo excesso de iodo (Leung AM, Braverman LE.; 2014). Apesar destes relatos, outros estudos sugerem que as ingestões de iodo acima de 150μg/dia parecem ser bem toleradas, a menos que haja suscetibilidade clínica a problemas tiroidianos.
O sal de cozinha iodado é uma boa fonte de iodo para os veganos, além do mais, o iodo pode ser encontrado em alimentos como batatas, pães e cranberries. Sendo assim, a suplementação não é aconselhável, a não ser em casos comprovados de falta ou ingesta insuficiente.
A vitamina D é uma vitamina lipossolúvel, produzida na pele e é essencial para a absorção do cálcio e da saúde óssea, além de desempenhar papel importante em muitos processos fisiológicos. Os humanos sintetizam vitamina D quando expostos à luz solar, mas podemos encontrá-la em alimentos de origem animal e alimentos fortificados com vitamina D.
O colecalciferol (D3) é um derivado animal da vitamina D, e amplamente disponível em forma de suplemento. O ergocalciferol (D2), de origem vegetal, é uma versão vegan-friendly da vitamina D, mas parece ser menos biodisponível do que o colecalciferol. No entanto, versões vegan-friendly de colecalciferol derivados do líquen, um organismo composto de algas fúngicas tornou-se comercialmente disponível, oferecendo uma opção de suplemento mais biodisponível que as anteriores, inclusive apresentando dosagens de 200 a 1000UI por cápsula, como o colecalciferol. Nos EUA, a IDR de vitamina D é de 600UI/dia. No Reino Unido, a IDR sugerida é de 10μg/dia (400UI) para indivíduos que não conseguem tomar sol.
Cannell et al. sugeriram que a suplementação pode melhorar o desempenho atlético e físico em pacientes deficientes de vitamina D. De fato, Moran et al. destacaram que a deficiência da vitamina D afeta negativamente, tanto a força muscular, quanto o consumo do oxigênio, ainda sugerindo que a suplementação desta vitamina pode proteger contra lesões por excesso de esforço físico através do seu papel no metabolismo de cálcio e função no músculo esquelético. Então, a otimização dos níveis de vitamina D é importante para todos os atletas, independentemente da dieta (Ceglia, 2008).
A dosagem sérica de vitamina D pode indicar se há necessidade de suplementação com a coleta sanguínea e os níveis de 25OHD podem indicar deficiência se os valores estiverem menores de 20ng/ml.
Alguns estudos sugerem valores entre 40 e 70ng/ml (Larson-Meyer DE &Willis KS, 2010; Bischoff-Ferrari HA, 2008). Dalqhuist et al., no entanto, sugere que atletas mantenham níveis plasmáticos de 25OHD na faixa entre 30-40ng/ml e que a suplementação de vitamina D nas doses entre 4000-5000UI/dia, juntamente com 50–100μg/dia de vitamina K1 e K2, poderiam otimizar a recuperação do exercício, permitindo que os atletas treinem com mais frequência. Valores séricos de 25OHD>150ng/ml com hipercalcemia (cálcio elevado no sangue) são geralmente considerados como toxicidade, ou seja, intoxicação por vitamina D.
Mais pesquisas são necessárias para determinar doses de vitamina D para atletas, mas, por veganos não consumirem fontes animais de vitamina D, sua dosagem laboratorial pode ser indicada, principalmente em quem não tomar sol com regularidade.
Vários estudos indicam que dietas vegetarianas e veganas reduzem armazenamentos musculares de creatina, um composto nitrogenado sintetizado a partir dos aminoácidos arginina, glicina e metionina. Já tivemos em nossa coluna, duas matérias muito legais sobre creatina, tanto na performance muscular, quanto nos seus benefícios, além da performance muscular, valendo a pena a leitura.
Alimentos de origem animal, como carnes, peixes e aves, são fontes de creatina, porém, não fazem parte da dieta vegana. Muitos estudos demonstram como os efeitos da melhoria de desempenho, ocasionados pela creatina e sua suplementação, podem melhorar em curto prazo, o desempenho no exercício de alta intensidade, além de ocasionar hipertrofia e aumento da força muscular.
A suplementação de creatina também pode levar ao aumento do volume plasmático sanguíneo, melhor armazenamento de glicogênio muscular, melhor limiar ventilatório e redução do consumo de oxigênio durante exercício submáximo (Cooper R et al, 2012).
Curiosamente, alguns estudos indicam que a suplementação de creatina pode ser mais benéfica para atletas com reservas musculares baixas de creatina. Para destacar, Burke et al. descobriu que a suplementação em vegetarianos, que obviamente apresentavam reservas baixas de creatina, ocasionou melhora na massa magra, na força muscular máxima e na área das fibras musculares tipo II em comparação com onívoros. A suplementação de creatina pode, portanto, ser uma ajuda ergogênica importante para atletas veganos, diminuindo o impacto da baixa reserva de creatina muscular.
Para obtenção e saturação da creatina muscular pode ser feito o carregamento, que consiste na ingestão de 20g/dia, por 3 a 7 dias, seguida de dose diária de manutenção de 3-5g/dia. No entanto, resultados similares podem ser obtidos usando doses menores de 3-5g/dia, durante um período de quatro semanas (Hickner RC, 2010). Outros protocolos, como a ingestão de 1g 20 vezes ao dia, também foram sugeridos como meios para atingir saturação máxima (Sale C. et al, 2009).
A ingestão de creatina, juntamente com proteínas e carboidratos, pode aumentar a retenção da creatina na fibra muscular por meio do armazenamento mediado pela insulina, mas parece não ter diferença no desempenho comparado à ingesta isolada (Cooper R et al, 2012).
PARA ATLETAS VEGANOS QUE DECIDAM SUPLEMENTAR PÓ
As formas de creatina sintética em pó são vegan-friendly, já as cápsulas de creatina podem conter gelatina bovina.
Semelhante aos níveis de creatina muscular, estudos indicam que os vegetarianos têm níveis mais baixos de carnosina muscular em comparação aos onívoros (Everaert J. et al, 2011; Harris RC. et al, 2007). A carnosina (β-alanil-l-histidina), composto intracelular com função antioxidante, é um agente citoplasmático encontrado no músculo esquelético e o sistema nervoso central é precursor limitante da β-alanina.
As carnes e as aves são as principais fontes de β-alanina, o que mostra sua baixa ingesta em veganos e vegetarianos. A dieta e a suplementação com β-alanina podem aumentar as concentrações musculares de carnosina, levando a melhora no desempenho do exercício de alta intensidade, eliminação de radicais livres, além de seu efeito quelante antimetais de transição e seu efeito tampão, reduzindo a fadiga muscular (Harris RC. et al, 2007; Trexler ET et al, 2015).
A eficácia da suplementação de β-alanina em doses divididas de 4-6g/dia, por 2–4 semanas, foi demonstrada no exercício com mais de 60 segundos de duração, no aeróbico, na diminuição da fadiga muscular e no desempenho em exercícios de alta intensidade (Trexler ET et al, 2015). Entretanto, o efeito da suplementação em exercício com duração menor de 60 segundos, ainda não é claro. Devido aos níveis de carnosina muscular serem menores em vegetarianos do que onívoros, a suplementação de β-alanina pode ser indicada e benéfica em veganos. Mais pesquisas são necessárias para validar esta hipótese.
A taurina e a β-alanina compartilham mecanismos de transporte celular, significando que a suplementação de β-alanina poderia inibir, teoricamente, a captação de taurina no músculo esquelético. A taurina é um aminoácido contendo enxofre que desempenha papel importante em vários processos fisiológicos, incluindo conjugação de ácidos biliares, função cardiovascular e transmissão nervosa na homeostase glicêmica e é obtida pela ingestão alimentar de frutos do mar, carnes e produtos lácteos.
Veganos consomem quantidades menores de taurina (Rana SK & Sanders T., 1986) e estudos sugerem que eles podem se beneficiar de suplementos de taurina. Ainda faltam estudos para indicar com segurança a suplementação de β-alanina e de taurina em pacientes veganos, mas conseguimos demonstrar que uma dieta vegana pode alcançar as necessidades nutricionais dos atletas vegetarianos se houver estratégia nas escolhas, levando em conta o valor energético dos alimentos e da dieta como um todo, observando as recomendações e proporções dos macros e micronutrientes, juntamente com suplementação adequada, se for necessária.
Em atletas veganos, parece ser interessante a suplementação de creatina e β-alanina, pois estes têm baixas reservas musculares destas substâncias. Estudos mostram melhorias no desempenho e na performance, readequando seus níveis musculares. Porém, mais pesquisas são necessárias para investigar esses efeitos de aumento do desempenho com a suplementação destas e de quaisquer outras substâncias aqui descritas, em populações veganas.
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