Os poetas deslumbram-se em versos mexendo com nosso imaginário, no intuito de nos fazer acreditar na existência de universos paralelos. Não desacreditando no deslumbre dos poetas, mas baseado em descobertas científicas, a tradução literal da proposta poética é que o mundo chega até nós através dos sentidos. Sentir é perceber o que está ao nosso redor, é perceber a vida pulsante que nos invade através do olfato, tato, paladar, audição e visão. Os elementos que captam os estímulos e os transmitem ao sistema nervoso central, para análise e reação são denominados receptores.
Os receptores (do latim recipere = receber) são especializações do tecido nervoso sensíveis a alterações lesivas. Dentre as diferentes sensações que preenchem nosso organismo, há uma modalidade sensitiva que chamamos de dor, a qual cientificamente é classificada como uma sensação importante com a função de alertar sobre danos que devem ser evitados ou tratados. É importante destacar que, de forma diferente de outras modalidades sensoriais, a dor é um código sensorial deflagrado por uma sensação desagradável, criada por um estímulo nocivo que migra da área afetada em direção ao sistema nervosocentral, percorrendo vias específicas e demarcando fortes expressões de aspecto físico, emocional e afetivo. Dentre a multifatoriedade dos processos envolvidos na experiência sensorial da dor, dois são merecedores de destaque: a percepção e a reação.
Para codificar essa sensação, nosso organismo se especializou em desenvolver um tipo de sensor chamado receptor sensorial nociceptivo, ou somente nociceptor, ativado por estímulos nocivos aos tecidos como, por exemplo, ação térmica, ou seja, calor ou frio intenso; ação mecânica como uma pressão intensa, ou ainda um tipo especial cuja ação é polimodal, que são ativados por estímulos mecânicos, químicos ou térmicos de alta intensidade. Para melhor entender este padrão polimodal, vamos exemplificar com uma situação na qual um grande choque é aplicado em uma parte de nosso corpo causando um trauma. Inicialmente, sentimos uma dor aguda imediata a primeira dor, seguido de uma segunda dor na forma de ardência e difusa (polimodal), existindo duas fases distintas de sensações: uma de proteção e outra de manutenção e reparo, ambas processada no centro límbico que traduz a sensação dolorosa em comportamento. A reação à dor é uma manifestação da percepção de uma experiência desagradável. A fase do processo da dor envolve fatores neuroanatômicos e fisiopsicológicos extremamente complexos que englobam diversas áreas do sistema nervoso central, hierarquicamente descritas como hipotálamo, tálamo, sistema límbico e córtex. Estas áreas integradas determinam os múltiplos padrões comportamentais frente à experiência desagradável.
Dentro de uma descrição mais ampla dos aspectos científicos ligados aos nociceptores, sabe-se que os receptores apresentam inúmeras propriedades tais como: a adaptação e excitação, conceitos ligados à capacidade de interpretar estímulos de intensidade limiar; especificidade, capacidade de ser ativado por uma modalidade sensitiva única; intensidade, capacidade de distinguir o grau de estimulação. Analisando os caminhos da dor, sabe-se que as células nervosas, excitadas por um estímulo, geram impulsos que se propagam em direção à medula espinhal e daí migram para o sistema nervoso central, onde as intensidades são compiladas e um padrão comportamental implantado. Como informação complementar, cabe ressaltar que a dor gerada por estímulos intensos e potencialmente lesivos, desencadeia reações neuroquímcas com liberação de mediadores químicos, como a Bradicinina, Prostaglandinas, Óxido Nítrico, entre outros, que são responsáveis pela indução de alterações vasculares e imunológicas, e também participam das reações inflamatórias.
A dor e o exercício
Muitos indivíduos se submetem a exercícios extenuantes, constantemente permeados por atividades de sobrecarga progressiva e desacoplados de acompanhamento especializado, não respeitando a periodicidade de adaptação. Nestas condições, estão fortemente expostos ao desenvolvimento de lesões ou desconfortos, como a dor muscular que aparece algumas horas após a prática da atividade física vigorosa. Para uma grande parcela das pessoas a associação dor e intensidade dos exercícios é muito comum. A prática de atividade física, nas suas mais diferentes nuances - tais como lazer, melhora da saúde, competição amadora ou profissional – tem relações diretas com a presença da dor, ou como dizia o poeta “a vida dói”. Cuidados especiais devem compor o dia a dia de educadores físicos e treinadores, principalmente no que se refere ao controle da sobrecarga (overtraining). Atuando no sentido de promover o aprimoramento no rendimento sem submeter o organismo a um excesso de exercícios, fazendo a progressão adequada, no sentido de adquirir respostas adaptativas e uma maior eficiência das respostas orgânicas. Cabe ao treinador programar suas ações para não exceder os limites e, com isso, desenvolver dor ou desconforto ao atleta ou praticante.
No esporte tem sido descritas inúmeras causas de dor com diferentes origens funcionais, tais como: musculoesquelética, lesões tendinosas, lesões ligamentares, lesões da cartilagem articular, fraturas, luxações, entorses, contusões ou, ainda, a dor muscular de manifestação tardia. Dentre a gama de condições ativadoras da nocicepção, as afecções mais comuns são lesões musculares em atletas de alto rendimento e dor muscular de início tardio em praticantes casuais. Estas dores são sinalizadores que algo está errado com o corpo do atleta ou praticante de atividade física e merecem atenção constante, pois se não diagnosticadas e tratadas corretamente, podem provocar afastamento dos treinos e potencializar o desenvolvimento de lesões mais graves. Os fatores causais ligados à dor são inúmeros, tendo relação com a idade, nível de atividade ou condicionamento, volume e intensidade de treino, condição dos calçados utilizados e afecções pregressas que não foram tratadas por completo.
A partir da instalação de processos dolorosos deflagram-se respostas marcadoras de estresse, que promovem a secreção de grandes quantidades de hormônios e neurotransmissores, gerando respostas orgânicas ou comportamentais, tais como taquicardia, elevação na pressão arterial, tremores periféricos, limitação funcional, além de manifestações emocionais caracterizadas por choro, ansiedade e até pânico, fatores que de forma associada limitam a prática saudável da atividade física. O controle da dor está relacionado ao uso de recursos farmacológicos (medicação), ou meios físicos, tais como o repouso ou a imobilização. A dor no atleta deve ser tratada de maneira eficiente, pois está diretamente relacionada com a perda de rendimento. Cabe aos profissionais intervirem para que o atleta retorne o mais breve possível à prática esportiva e de forma saudável, evitando assim a recorrência de novas lesões. Aos educadores físicos e treinadores é importante intervir não só na causa básica da dor, mas também no programa de treinamento e no uso de equipamentos adequados.
Lembre-se, um atleta sem dor é aquele que sempre buscará melhorar suas marcas e chegar à performance idealizada. Auxilio da suplementação Cabe ressaltar que na literatura científica estão descritos os inúmeros benefícios dos suplementos alimentares propiciando as melhores condições e estratégias refinadas frente a lesão. Como exemplo temos a creatina, o BCAA e a glutamina para a manutenção de condições energéticas ideais. Esses suplementos igualam a disponibilidade de substratos metabolizáveis à demanda, provocada pela atividade física de grande intensidade, e dão assistência tanto na manutenção de condições homeostáticas ideais, quanto no reparo tecidual pós-lesão.
Comentários