Processo que está na base das dietas que restringem a ingestão de carboidratos e priorizam a ingestão de lipídios e proteínas, o estado de cetose ocorre quando o corpo vai buscar na gordura armazenada um recurso energético para se manter. Descubra porque existe tanta polêmica em torno desse assunto:
1 - Mecanismo de emergência
Desde que você levantou da cama, se vestiu, iniciou as atividades diárias e até mesmo agora, enquanto está lendo essa matéria, o seu corpo tem consumido energia. Na maior parte desse tempo, é doscarboidratos presentes em nossa dieta que o metabolismo tira o combustível necessário para se manter, mas existem situações especiais em que essa dinâmica se altera. “Os carboidratos são nossa fonte primária de energia. Eles estimulam a secreção de insulina pelo pâncreas e a insulina age transportando a glicose do sangue para utilização das células ou para ser armazenada como energia de reserva”, explica o especialista em Nutrição Esportiva, Marcus Ávila. “Quando a alimentação não apresenta carboidratos, a glicose no sangue cai, suprimindo a produção de insulina pelo pâncreas, o que obriga o corpo a utilizar outras fontes energéticas. Nesta situação, a gordura passa a ser a fonte principal para conseguir energia”. A essa mudança de rumos os especialistas dão o nome de cetose, um estado fisiológico no qual o corpo, para adquirir energia, produz corpos cetogênicos. “O fígado degrada gordura em ácidos graxos que, por sua vez, são convertidos em corpos cetônicos. Esses corpos cetônicos são lançados na corrente sanguínea e podem ser utilizados como combustíveis pelo tecido muscular esquelético e cardíaco e ainda pelo córtex da supra-renal e tecido nervoso”, detalha o médico especialista em Nutrologia e Metabologia, Mohamad Barakat.
2 - Quando o alarme soa
Essa mudança no esquema de buscar combustível ocorre toda vez que falta glicose no organismo. “Basicamente o corpo utiliza a via cetogênica na ausência de glicose no sangue, falta de alimentação, no jejum prolongado e durante sessões de exercícios de longa duração e alta intensidade” diz Marcus Ávila. Existe ainda uma situação anormal de produção de corpos cetogênicos chamada cetoacidose. “É uma situação associada ao diabetes tipo 1 e diabetes tipo 2 insulino dependente. Devido à ausência total de insulina, há uma produção maciça de corpos cetônicos acima dos valores fisiológicos”, detalha o especialista.
3 - Fadiga como resultado
Aquela moleza que temos quando passamos por um longo período de jejum também está ligada ao processo de cetose. “Quando em cetose, a aquisição de energia acontece de forma mais lenta. Para repor os nossos estoques de glicogênio precisamos realizar a gliconeogênese a partir de aminoácidos, o que nem sempre acompanha a necessidade de energia urgente do organismo em atividade”, explica Ávila. “Esta mudança de via metabólica impõe uma queda de desempenho atlético, principalmente na reposição de glicogênio para os músculos, pois, agora, precisam converter aminoácidos advindos da ingestão de proteínas”. O médico Barakat ressalta ainda que o corpo tem uma espécie de escala de importância para este fornecimento de energia e que a prioridade são sempre os órgãos vitais.
4 - Uso em dietas
Baseado nessa espécie de recurso de emergência do corpo para obter energia, alguns especialistas criaram programas alimentares que visam provocar um estado metabólico de cetose reduzindo o consumo de carboidratos e elevando o consumo de gorduras e proteínas. O objetivo da dieta chamada de cetogênica seria o de reduzir os estoques de gordura do corpo. De acordo com Marcus Ávila, o primeiro a utilizar esse conceito foi o cardiologista americano Robert Atkinks, há mais de 40 anos. “No princípio de Atkins, um consumo maior de proteínas e gorduras era estimulado e não era permitido comer nenhum tipo de carboidratos, inclusive o das frutas e verduras”, diz. “Este tipo de dieta foi alvo de muitas críticas durante anos, sob o receio de promover aumento de colesterol e doenças cardíacas”. Ainda segundo Marcus outros especialistas também se basearam no princípio para desenvolver diferentes programas alimentares. “O conceito de Atkins deu origem a várias outras modalidades de dietas como a South Beach, Dr. Stillman, etc, todas contendo muita proteína e gordura que promoviam a cetose, porém, de forma muito acentuada e descontrolada”.
5 - Os prós
Para o especialista em Nutrição Esportiva Marcus Ávila, as dietas cetogênicas atuais são seguras e podem trazer benefícios à saúde. “Hoje em dia, os programas cetogênicos se baseiam em uma ingestão moderada de proteínas, gorduras e uma restrição controlada de carboidratos. A distribuição de macronutrientes em uma dieta cetogênica é cerca de 70-75% de calorias provenientes de gorduras, 20-25% de proteínas e 5-10% de carboidratos”, explica – lembrando que as gorduras são mais calóricas que os outros macronutrientes. “Como não há mais a indicação de se aumentar o consumo de alimentos ricos em gorduras e proteína o que acontece é uma cetose leve, controlada e capaz de mobilizar bastante gordura, obtendo-se uma redução gradual da quantidade de gordura corporal”. Outra vantagem apontada por Ávila nas dietas cetogênicas é a manutenção da massa magra. “A maior parte das pessoas que desejam perder gordura acreditam que a melhor opção para isto é realizar o balanço energético negativo, ingerindo menos calorias que o gasto diário. Desta forma, pode-se sim conseguir ajustar o percentual de gordura, mas pode ocorrer também a redução de um volume considerável de massa magra”, aponta. “Um programa cetogênico é uma boa estratégia para se conseguir reduzir a gordura corporal promovendo um prejuízo mínimo à massa magra”. Menor apetite, menor desejo por doces, maior eliminação de sódio e menor retenção de líquidos, melhora dos sintomas pré-menstruais, redução acentuada do colesterol total e LDL, controle da resistência insulínica e maior eficiência da ação da insulina também são benefícios apontados pelo especialista como resultado das dietas cetogênicas e a perda de gordura por ela promovida.
6 - Os contras
O médico Mohamed Barakat, por sua vez, lembra que o comitê de nutrição da American Heart Association publicou recentemente um alerta científico de que as dietas ricas em proteínas apresentam riscos à saúde. “Segundo o relatório, tais dietas podem produzir perda de peso em curto prazo através de desidratação. A perda de peso também pode ocorrer através da restrição calórica, que é resultante do fato de que as dietas são relativamente intragáveis, por isso as pessoas comem menos”, afirma. Para o especialista, uma dieta sempre deve ser equilibrada visando melhor qualidade de vida e bem-estar, promovendo a saúde. O profissional coloca em cheque os benefícios das dietas cetogênicas. “Assim que se inicia uma dieta cetogênica, grandes quantidades de água serão perdidas levando a pessoa a crer que está ocorrendo uma redução significativa de peso. Entretanto, a maior perda é de água ao invés de gordura”, diz. “Qualquer melhora nos níveis de colesterol sanguíneo e controle da insulina seria devido à perda de peso, e não à mudança na composição. Ainda de acordo com Barakat apenas grupos muito específicos poderiam se beneficiar das dietas que visam produzir corpos cetogênicos. “É importante lembrar que as dietas cetogênicas só trarão algum benefício à saúde quando utilizadas em casos patológicos, como controle no tratamento da epilepsia, disfunções neurais, hepatopatias, dentre outras”, conta. “O mais importante é ressaltar que toda dieta deve ser acompanhada e preconizada por médicos especialistas ounutricionistas, para evitar quaisquer prejuízos ao organismo. Deve-se tomar muito cuidado com dietas da moda e sempre procurar um profissional para o acompanhamento”, alerta.
7 - Contra-indicações
Para Barakat, uma dieta de alto teor de proteínas é especialmente perigosa para pacientes com diabetes “porque pode acelerar a progressão da doença renal diabética”. Marcus Ávila afirma que, além dos diabéticos, quem consome álcool de forma abusiva também deve evitar dietas que promovam a produção de corpos cetogênicos. “Não deve ser utilizada também por indivíduos alcoolistas porque apesar da baixa frequência, pode ocorrer cetoacidose alcoólica”.
8 - Suplementos
A suplementação alimentar desempenha um papel fundamental tanto para evitar o processo de cetose quanto para quem decidiu adotar uma dieta com esse princípio. Durante a prática esportiva, é fundamental fornecer carboidratos suficientes para que o organismo transforme em energia. Neste caso entram em cena os suplementos à base de carboidratos ou que tenham este macronutriente em sua composição como: maltodextrina, dextrose, ribose, os hipercalóricos e os energéticos. Já quem deseja adotar uma dieta cetogênica deve incluir no programa alimentar as proteínas.“Os suplementos alimentares têm um papel importante nas dietas cetogênicas como repositores energéticos antes e pós-treino e na síntese proteica, como poupadores musculares”, diz o médico Barakat. “Pode-se utilizar suplementos como óleo de coco, TCM, whey protein. Deve-se observar os rótulos para que não consumam grandes quantidades de carboidratos”. Outras proteínas como soy protein e albumina, os aminoácidos, a creatina, as vitaminas e minerais são as indicações de Ávila para os programas alimentares cetogênicos.
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