ALIMENTAÇÃO & NUTRIÇÃO

Como a não fiscalização dos agrotóxicos pode afetar a saúde?

Especialista explica os riscos do alto índice de agrotóxicos nos alimentos e como se prevenir

Como a não fiscalização dos agrotóxicos pode afetar a saúde? Como a não fiscalização dos agrotóxicos pode afetar a saúde?
Crédito: BANCO DE IMAGENS

Recentemente, os altos índices de agrotóxicos encontrados no feijão, alimento fundamental na alimentação principal dos brasileiros, trouxe à tona diversos questionamentos dos impactos e malefícios desses compostos na saúde humana.

De acordo com a Lei no 7.802, de 11 de julho de 1989, os agrotóxicos são definidos  como produtos e agentes de processos físicos, químicos ou biológicos, destinados ao uso nos setores de produção, no armazenamento e beneficiamento de produtos agrícolas, nas pastagens, na proteção de florestas, nativas ou plantadas, e de outros ecossistemas e de ambientes urbanos, hídricos e industriais, cuja finalidade seja alterar a composição da flora ou da fauna, a fim de preservá-las da ação danosa de seres vivos considerados nocivos, bem como as substâncias e produtos empregados como desfolhantes, dessecantes, estimuladores e inibidores de crescimento.

O alto índice de agrotóxicos na produção dos alimentos pode trazer impactos nocivos para a saúde humana. Segundo Ana Paula Gasques Meira, professora de Nutrição do Centro Universitário Nossa Senhora do Patrocinio (Ceunsp), ao considerar o significado - de risco, ou seja, a probabilidade de um efeito adverso ocorrer em circunstâncias específicas de exposição a um determinado agente, o fato dos alimentos poderem conter resíduos de agrotóxicos coloca a saúde da população em risco.

Ana aponta que os efeitos nocivos dos agrotóxicos para a saúde da população podem ocorrer a partir das exposições agudas e/ou crônicas. As intoxicações agudas são aquelas em que o indivíduo tem uma exposição durante um curto período, sob altas doses da substância, cujas reações são imediatas. A exposição crônica ocorre quando os indivíduos têm contato com os agrotóxicos durante um longo período, e em quantidades pequenas, associada principalmente com o consumo de alimento contendo resíduos desses compostos.

“Exemplos dos impactos da exposição aos agrotóxicos na saúde humana são alguns tipos  de câncer, problemas neurológicos, malformações congênitas, problemas reprodutivos, imunotoxicidade, desregulação do sistema endócrino, entre outros. Existem também estudos que mostram a relação da exposição intra-uterina com anomalias congênitas e outros que apontam para contaminações no leite  materno”.

“A maioria dos agrotóxicos são tóxicos para organismos não-alvo, comprometendo a saúde humana, especialmente se não forem utilizados de acordo com as recomendações de  segurança”, explica a nutricionista.

Segundo Ana Paula, o consumidor não consegue identificar se um alimento tem agrotóxico. “A partir do momento que consumir alimentos produzidos no modo convencional, ou seja, que utilizaram desses insumos no processo de cultivo, existe a  probabilidade desses alimentos conterem os resíduos de agrotóxicos”. E para evitar os riscos “não aceitáveis” para  a saúde humana,  é fundamental o monitoramento frequente por parte da ANVISA”.

Gasques reforça sobre a necessidade da comunicação de risco e informações direcionadas para a população sobre esses compostos, de modo que as pessoas tenham cada vez mais conhecimento sobre o tema e que particpem dos processos de discussões a respeito das regulamentações e monitoramento.

“É inegável a importância dos agrotóxicos para impulsionar o sistema de produção agrícola, todavia, por mais adequados e verídicos os dados sobre as perdas ocasionadas por pragas, não justificam o volume dessas substâncias utilizadas atualmente”.

 

Como a não fiscalização dos agrotóxicos pode afetar a saúde?

 

Conforme a Portaria GM/MS nº 1.378, de 9 de julho de 2013, a definição legal de vigilância em saúde enfatiza que a vigilância precisa ter caráter contínuo e sistemático, não somente para registro de dados, mas também para adoção de medidas de proteção e promoção da saúde.

A professora de Nutrição aponta que o monitoramento dos resíduos de agrotóxicos potencialmente contidos nos alimentos é uma das formas de controle da exposição a esses compostos. A partir do momento que não existe o acompanhamento dos limites de resíduos nos alimentos e e do ingrediente ativo (IA) autorizado para a cultura alimentar, o risco de exposição e potenciais efeitos adversos à saúde aumentam.

“No Brasil, sob responsabilidade da ANVISA, foi instituído por meio da Resolução nº 119, de 19 de maio de 2003, o Programa Nacional de Monitoramento de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (PARA), visando o controle contínuo de resíduos de agrotóxicos em alimentos de origem vegetal e desde a implantação do programa existem apontamentos sobre a escassez de recursos financeiros e mão-de-obra capacitada, além dos problemas de infraestrutura dos laboratórios credenciados, limitando o avanço do programa”, avalia.

Por fim, a professora reforça que não há como substituir a principal medida preventiva que é essencialmente a regulamentação, incluindo os critérios para os registros dos ingredientes ativos (IAs), especialmente para aqueles com elevadas situações de risco; fiscalização e monitoramento nas esferas estaduais e federais.

Contudo, compreender a percepção sobre os potenciais riscos que os agrotóxicos conferem à saúde e atuar no sentido de educação de maneira ampla, orientando sobre a importância da higienização adequada dos alimentos de origem vegetal, não apenas no quesito contaminação  por agrotóxicos, mas por conta de outras fontes de contaminação dos alimentos, e trazer a importância de se consumir alimentos da época e a rastreabilidade dos produtos consumidos, são importantes medidas no contexto de proteção da saúde. “Desse modo, pontua-se que a obrigação da proteção em relação à saúde da população é do poder público e o foco é no empoderamento da população para que exijam dos órgãos competentes o cumprimento dessas obrigações”.

É preciso ampliar as discussões acerca da agroecologia como uma técnica alternativa ao modelo da agricultura químico-dependente e, desse modo, aumentar os investimentos em pesquisas nesta área. A agroecologia compreende ainda um olhar sobre as comunidades tradicionais, submetidas ao sistema produtivista do agronegócio, responsável pela deterioração dos seus modos de vida tradicionais. A união entre investimentos maciços em pesquisas sobre agroecologia e o conhecimento das comunidades tradicionais seria um possível caminho para a prevenção da saúde coletiva e do meio ambiente, além do engajamento dos diferentes atores envolvidos nesta temática.

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