O impacto endócrino decorrente do uso de Hormônios Esteroides Anabolicos levanta preocupações significativas quanto à supressão do eixo hipotálamo-hipófise-gonadal (HHG) e a necessidade de intervenção terapêutica pós-ciclo (TPC). Este artigo revisa a literatura disponível e examina a eficácia e a necessidade da TPC na recuperação endócrina após o uso de EAs, abordando se esta prática é respaldada por evidências científicas ou se constitui um mito amplamente difundido.
Introdução
O uso de EAs tem se tornado cada vez mais prevalente não apenas entre atletas de elite, mas também entre amadores e frequentadores de academias. Estes compostos, ao mimetizar os efeitos da testosterona, promovem o aumento da massa muscular e a redução do tecido adiposo, mas também causam a supressão do eixo HHG, resultando em hipogonadismo secundário. A TPC é frequentemente recomendada para restaurar a função endógena do HHG, mas a evidência de sua eficácia é controversa.
Metodologia
Foi realizada uma revisão sistemática da literatura utilizando as bases de dados PubMed, Scopus e Google Scholar. Foram incluídos estudos clínicos, revisões sistemáticas e meta-análises publicados entre 2000 e 2023 que abordassem os efeitos dos HEA no EHHG e a eficácia da TPC.
Resultados
Efeitos dos Hormônios Esteroides Anabólicos no Eixo Hipotálamo-Hipófise-Gonadal
O uso de EA resulta em feedback negativo no Eixo HHG, reduzindo a secreção de hormônio liberador de gonadotrofina (GnRH), hormônio luteinizante (LH) e hormônio folículo-estimulante (FSH). Este efeito supressor pode variar em intensidade e duração dependendo do tipo, dose e duração do uso dos esteroides.
Estudos Clínicos e Evidências Empíricas
Estudos clínicos demonstram que a recuperação endócrina espontânea pode ocorrer, mas pode ser lenta e incompleta, resultando em hipogonadismo persistente em alguns casos. A TPC é proposta para acelerar essa recuperação e minimizar os sintomas associados.
Terapia Pós Ciclo: Intervenções e Protocolos
Clomifeno e Tamoxifeno
Os moduladores seletivos do receptor de estrogênio (SERMs), como clomifeno e tamoxifeno, são frequentemente usados na TPC para estimular a secreção de LH e FSH. Estudos indicam que estes agentes podem ser eficazes na restauração dos níveis de testosterona, mas a resposta pode variar entre indivíduos.
Gonadotrofina Coriônica Humana (hCG)
A hCG é utilizada para mimetizar a ação do LH e estimular a produção de testosterona pelos testículos. Estudos sugerem que a hCG pode ser benéfica em protocolos de TPC, especialmente em casos de supressão severa do Eixo HHG.
Inibidores da Aromatase
Os inibidores da aromatase são usados para reduzir a conversão de testosterona em estrogênio, visando evitar os efeitos adversos do excesso de estrogênio e promover um ambiente hormonal favorável à recuperação do Eixo HHG.
Evidências Contrárias e Críticas
Falta de Estudos Randomizados Controlados
Apesar do uso difundido da TPC, há uma escassez de estudos randomizados controlados que validem sua eficácia. A maioria dos dados disponíveis provém de estudos observacionais e relatos de casos, limitando a robustez das conclusões.
Recuperação Espontânea
Alguns estudos sugerem que o Eixo HHG pode se recuperar espontaneamente após a cessação do uso de HEA, questionando a necessidade absoluta da TPC. A variabilidade individual na resposta à descontinuação dos HEA indica que a necessidade de TPC pode não ser universal.
Discussão
Benefícios Potenciais da TPC
Os benefícios potenciais da TPC incluem a aceleração da recuperação do Eixo HHG, redução do tempo de hipogonadismo e mitigação dos sintomas adversos como fadiga, depressão e perda de libido.
Riscos e Limitações da TPC
Os riscos da TPC incluem os efeitos colaterais dos medicamentos usados, como ginecomastia, trombose e alterações hepáticas. Além disso, a falta de padronização nos protocolos de TPC dificulta a avaliação objetiva de sua eficácia.
Considerações para Prática Clínica
A decisão de implementar a TPC deve ser individualizada, considerando a gravidade da supressão do Eixo HHG, os sintomas do paciente e a disponibilidade de monitoramento adequado. A consulta com um endocrinologista experiente é crucial para o manejo adequado.
Considerações Finais
A TPC após o uso de EA é um campo de estudo que carece de evidências robustas e consenso clínico. Enquanto alguns dados sugerem benefícios na recuperação endócrina, a variabilidade na resposta individual e a ausência de estudos controlados exigem cautela na adoção universal de protocolos de TPC. Mais pesquisas são necessárias para estabelecer diretrizes claras e baseadas em evidências para o manejo endócrino após o uso de Hormônios Esteroides Anabólicos.
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