Entre elas, o joelho é particularmente vulnerável, pois suporta grandes cargas e está envolvido em praticamente todos os movimentos da vida diária. Mas uma dúvida frequente tanto entre profissionais de saúde quanto entre praticantes de atividade física é: o joelho de quem pratica esporte regularmente envelhece melhor ou pior do que o de quem leva uma vida sedentária?
A resposta não é simples e depende de múltiplos fatores, como o tipo e a intensidade da atividade física, a presença de lesões prévias, o controle de peso corporal e a genética. Este artigo explora as principais diferenças entre o “joelho de atleta” e o “joelho de sedentário”, analisando quem sofre mais com o envelhecimento articular à luz da literatura científica.
O que é o envelhecimento articular?
Com o passar dos anos, a cartilagem do joelho — tecido que recobre as extremidades ósseas — sofre uma série de alterações fisiológicas: perda de conteúdo de água, diminuição da produção de proteoglicanos, alterações na matriz colágena e redução da capacidade de regeneração. Essas mudanças tornam a cartilagem mais frágil e suscetível a fissuras e desgaste progressivo, levando à osteoartrite (artrose), uma das doenças mais comuns em idosos.
Além da cartilagem, outras estruturas também envelhecem:
• Meniscos tornam-se mais rígidos e sujeitos a lesões degenerativas;
• Ligamentos perdem elasticidade;
• Músculos sofrem sarcopenia, afetando a estabilidade articular;
• Sinóvia pode produzir menos líquido sinovial, prejudicando a lubrificação da articulação.
Essas alterações ocorrem em qualquer pessoa, mas a velocidade e a gravidade com que afetam o joelho podem ser moduladas pelo estilo de vida.
O joelho do atleta: estímulo ou sobrecarga?
Atletas — especialmente de modalidades de impacto como corrida, futebol ou tênis — submetem suas articulações a cargas repetidas e, muitas vezes, a microtraumas constantes. Isso levanta a hipótese de que o uso excessivo da articulação ao longo da vida possa acelerar o desgaste articular.
De fato, estudos mostram que esportes de alto impacto com carga elevada e movimentos explosivos estão associados a um maior risco de desenvolvimento precoce de artrose, especialmente em atletas profissionais ou com histórico de lesões. Um exemplo claro é a relação entre lesão do ligamento cruzado anterior (LCA) e degeneração precoce do joelho.
Segundo um estudo de Lohmander et al. (2004), ex-atletas com histórico de lesão no LCA apresentaram uma incidência significativamente maior de artrose do joelho 10 a 15 anos após a lesão, mesmo após reconstrução ligamentar e reabilitação adequada.
Por outro lado, o exercício físico moderado e regular tem efeito condroprotetor, ou seja, protege a cartilagem articular. O estímulo mecânico adequado favorece a nutrição da cartilagem (que depende da compressão cíclica para absorver nutrientes do líquido sinovial), melhora o tônus muscular, estabiliza a articulação e reduz o risco de sobrecarga anormal.
Um estudo de Tanamas et al. (2007), com participantes idosos, demonstrou que pessoas ativas fisicamente apresentavam menor progressão de desgaste da cartilagem femorotibial em relação a sedentários, desde que não tivessem histórico de lesões traumáticas.
O joelho do sedentário: menos impacto, mais fragilidade
O estilo de vida sedentário, por sua vez, protege o joelho de traumas repetitivos ou lesões agudas, mas não está isento de consequências. A falta de movimento compromete a nutrição da cartilagem, enfraquece os músculos estabilizadores do joelho, aumenta a rigidez ligamentar e favorece o acúmulo de peso corporal — um dos maiores fatores de risco para o desenvolvimento de artrose.
Segundo estudos populacionais, o sobrepeso está diretamente associado ao surgimento e à progressão da osteoartrite do joelho, mesmo em pessoas que nunca praticaram esportes. Um estudo longitudinal de Felson et al. (1992) demonstrou que indivíduos obesos tinham até 4 vezes mais risco de desenvolver artrose do joelho do que pessoas com peso normal.
Além disso, o sedentarismo contribui para a perda da mobilidade articular e da propriocepção, piorando o desempenho funcional com o passar dos anos. Em idosos sedentários, é comum observar rigidez matinal, dores articulares mesmo em repouso e dificuldade para subir escadas ou levantar-se de uma cadeira — sinais de que o joelho perdeu sua eficiência biomecânica.
Joelho de atleta x Joelho de sedentário: quem envelhece pior?
Depende do contexto:
Característica Atleta recreacional Atleta de elite (alto rendimento) Sedentário
Estímulo condroprotetor Presente Excessivo, pode ser lesivo Ausente
Risco de lesão traumática Baixo Alto Muito baixo
Nutrição da cartilagem Boa Boa, mas com risco de sobrecarga Prejudicada
Tônus muscular e estabilidade Preservado Elevado Reduzido
Risco de artrose com o tempo Moderado Elevado (sobretudo com lesões) Elevado (por desuso e obesidade)
Portanto, o joelho de um sedentário tende a sofrer mais com o envelhecimento, especialmente pela associação com sarcopenia, obesidade, perda de mobilidade e menor estímulo articular. Já o joelho de atletas recreativos ou amadores, quando submetido a cargas controladas, com boa técnica e prevenção de lesões, envelhece com mais saúde e funcionalidade.
O grande desafio é para os atletas de elite ou com histórico de lesões, cuja prática esportiva intensa pode acelerar o desgaste articular, especialmente se não houver cuidados adequados de reabilitação e recuperação.
Conclusão
Envelhecer com um joelho saudável depende de um equilíbrio entre movimento, força, peso corporal e prevenção de lesões. A prática regular de atividade física de forma moderada e bem orientada contribui para a preservação da cartilagem e da funcionalidade da articulação. Por outro lado, tanto o sedentarismo quanto o excesso de atividade de alto impacto sem recuperação adequada podem ser prejudiciais.
Portanto, o melhor caminho para manter a saúde do joelho ao longo dos anos é praticar exercícios com moderação, evitar o sobrepeso, fortalecer a musculatura e tratar de forma adequada lesões articulares, sempre com orientação profissional.
Referências bibliográficas
1. Lohmander, L. S., Ostenberg, A., Englund, M., & Roos, H. (2004). High prevalence of knee osteoarthritis, pain, and functional limitations in female soccer players twelve years after anterior cruciate ligament injury. Arthritis & Rheumatism, 50(10), 3145–3152. https://doi.org/10.1002/art.20589
2. Tanamas, S. K., Hanna, F. S., Cicuttini, F. M., Wluka, A. E., Berry, P., Urquhart, D. M., & Davies-Tuck, M. (2007). Does physical activity reduce the risk of developing knee osteoarthritis? A prospective cohort study. Arthritis Research & Therapy, 9(5), R63. https://doi.org/10.1186/ar2228
3. Felson, D. T., Zhang, Y., Hannan, M. T., Naimark, A., Weissman, B., Aliabadi, P., & Levy, D. (1992). Risk factors for incident radiographic knee osteoarthritis in the elderly: the Framingham Study. Arthritis & Rheumatism, 40(4), 728–733. https://doi.org/10.1002/art.1780400420
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